Brasil deve acabar com vacina contra pólio em gotinha para usar versão injetável

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Ministério da Saúde deve mudar a aplicação da vacina contra a poliomielite e acabar de vez com as famosas gotinhas, que passariam a ser substituídas pela vacina injetável. A vacina oral foi introduzida no Brasil na década de 1960.

A mudança, entretanto, não vai retirar das campanhas a imagem do Zé Gotinha, que foi criado em 1986 para ajudar nos esforços contra a doença.

Desde 2016 o esquema vacinal das crianças com menos de cinco anos consiste em um esquema primário, com vacina de vírus inativado de três doses —aos dois, quatro e seis meses. Já o reforço é feito aos 15 meses e aos quatro anos de idade, com a vacina oral de vírus atenuado, a famosa vacina “da gotinha”.

Segundo pessoas envolvidas com o tema, o Ministério da Saúde quer fazer a mudança para evitar uma possível volta da poliomielite por meio do vírus “mutante”, que em casos raros pode ser gerado pela vacina oral.

Isabella Ballalai, médica pediatra e diretora da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), disse que essa mudança já é preconizada pela OMS (Organização Mundial da Saúde).

A vacina oral da poliomielite é composta pelos vírus da pólio vivo e enfraquecido. Dessa forma, ele prolifera no intestino do vacinado sem causar doença, protegendo-o —é depois eliminado pelas fezes.

Pode ocorrer, no entanto, uma situação considerada rara. O vírus vacinal pode sofrer mutações dentro do organismo da pessoa vacinada, tornando-se capaz de causar doença em quem não está vacinado após ser eliminado pelas fezes.

Com a baixa cobertura vacinal, aqueles que não estiverem vacinados podem ser infectados pelo vírus presente em fezes e adoecer por causa desse vírus “mutante”. Nada acontece, porém, com quem está vacinado.

Já a vacina injetável é produzida com o vírus inativado e não tem como causar doença —seja para quem está vacinado, seja para quem não está.

Ballalai acrescenta que a OMS recomenda que países como o Brasil passem a utilizar a vacina inativada (injetável) sempre que possível. A SBIm também orienta que essa seja a vacina de preferência na administração de todas as doses.

“Essa é uma mudança que muitos países já fizeram. Existe chance de o vírus voltar para o Brasil. Evitar colocar mais vírus no ambiente, que está com cobertura vacinal baixa, traz menos risco. É uma nova situação”, explicou.

O Ministério da Saúde ainda pautará o tema na CTAI (Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização).

O Brasil corre risco de retorno da poliomielite. Em setembro do ano passado, a Opas (Organização Pan-Americana para a Saúde) declarou o Brasil como país de muito alto risco para a pólio. O alerta ocorre devido a uma cobertura vacinal abaixo de 95% em crianças menores de cinco anos com a possibilidade de reintrodução do vírus.

A pólio pode causar paralisia irreversível em alguns casos, mas pode ser prevenida por uma vacina disponibilizada pela primeira vez em 1955.

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ZÉ GOTINHA CONTINUA

Apesar dessa possível alteração, nada muda com o personagem do Zé Gotinha. Ele foi criado com o formato de uma gota em 1986 justamente para campanhas contra a poliomielite e acabou se tornando o símbolo da vacinação no Brasil.

O objetivo foi tornar a vacinação mais atrativa para as crianças. O país conseguiu erradicar a doença na década de 1990.

Em entrevista à Folha de S.Paulo em 2021, o artista plástico responsável pela criação do personagem, Darlan Rosa, disse que o Zé Gotinha surgiu em uma época em que o Brasil usava o terror como método de campanha, o que não vinha funcionando.

“Era ‘vacine ou morra’. E eu propus a quebra desse paradigma. Não se educa pela violência e pela imposição. A educação é pelo exemplo”, disse.

Na ocasião ele também criticou uma imagem divulgada nas redes sociais pelos filhos do então presidente Jair Bolsonaro (PL) que exibia um desenho do Zé Gotinha segurando uma vacina em forma de arma nas mãos. “Esse aí com a arma é péssimo.”

Autor(es): RAQUEL LOPES / FOLHAPRESS

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