CAMPINAS, SP (FOLHAPRESS) – A Prefeitura de Campinas (a 93 km de São Paulo) lançou casas populares de 15 metros quadrados para abrigar até sete pessoas. O tamanho dos imóveis é criticada por especialistas em arquitetura. Em uma rede social, o prefeito Dário Saadi (Republicanos) classificou a queixa como “coisa criada pela esquerda lacradora, que nada faz pela população e busca atrapalhar o trabalho de quem faz”.
Os imóveis no interior paulista foram anunciados pela Cohab (Companhia de Habitação Popular) como contrapartida para famílias que viviam em situação de risco em área invadida na periferia da cidade, próximo ao Aeroporto Internacional de Viracopos.
A prefeitura anunciou as casas de 15 m² ainda no fim do mês passado. Ao todo, são 116 unidades que devem atender 450 pessoas que vivem na Ocupação Mandela Vive há sete anos.
“Quando se pensa em três ou mais pessoas habitando um espaço de 15 metros quadrados, não há possibilidade de imaginar como será o convívio”, diz o professor Fábio Muzetti, da faculdade de Arquitetura e Urbanismo da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de Campinas.
Comparado à ocupação, para Muzetti, é inegável que haverá melhoras como saneamento, abastecimento de água e energia. “Mas essas pessoas vão continuar vivendo em situação precária, apenas um pouco mais humanizadas”, afirma. “Vão começar a criar ‘puxadinhos’ à sua maneira e desconfigurar o planejamento urbano do bairro. Desencadeia um efeito de favelização.”
Em São Paulo, a prefeitura recorreu a um modelo de casas modulares, com 18 m², para abrigar a população de rua.
Eleusina Holanda de Freitas, arquiteta e urbanista e responsável pela elaboração do último plano de habitação de Campinas, em 2010, vê como ineficaz a ação realizada pela Cohab. Para a especialista, o recurso poderia ser mais bem investido com planejamento que atendesse a necessidade das famílias.
“A reflexão tem que ser maior que apenas resolver a necessidade de moradia. Existe um órgão e existe o recurso para isso, por que nada foi feito antecipadamente se existe um plano? Essas condições ferem as diretrizes da própria ONU, que estabelece o mínimo de um cômodo, banheiro e uma unidade de cozinha”, disse.
Líderes da ocupação relatam sensação de “alívio” com o reassentamento, apesar do tamanho dos imóveis. Atualmente, as cerca de 90 famílias que vivem no espaço habitam barracos de madeirite e lona.
“Apesar de ser pequeno [o modelo], marca a luta de três gerações da minha família. Meus avós não tiveram casa, nem meus pais, mas eu vou ter e, consequentemente, meus filhos não terão que lutar por isso”, diz a auxiliar de educação infantil Phâmela Rocha, 34. Ela vai morar no espaço com o marido e dois filhos.
Para a cabeleireira Thamires Batista Gomes, 31, tamanha é a precariedade das atuais moradias que o embrião é uma grande conquista.
“Quando vou até a casa, sempre me emociono. Estamos aqui há sete anos, e já viemos de uma outra área de que fomos tirados após reintegração de posse, de maneira violenta. De uma forma ou de outra, poder dormir com a segurança de que você tem um lar é emocionante”, afirma, emocionada.
Professor da faculdade de ciências humanas da PUC Campinas, o sociólogo Vitor Berletta afirma que a questão preocupa da perspectiva da política pública.
“Da ótica da política pública, se a cidade tem uma boa política habitacional não precisa fazer esse tipo de ação emergencial desse tipo. Se interpretarem que o modelo ‘dá certo’, pode haver uma guinada da política de habitação popular para o modelo compacto”, diz.
Por meio de nota, a Cohab afirma que “as famílias vivem hoje em barracos de madeira de 4 a 5 metros quadrados, e que a aquisição inicial era somente o lote, não a construção”.
“Assim sendo, o embrião foi cedido para que as famílias tivessem o mínimo para vier com dignidade”, informa o comunicado
O texto diz ainda que serão feitos estudos para viabilizar o aumento dos imóveis, mas não estabelece prazo. As moradias populares devem ser entregues em cerca de dois meses. O investimento na obra foi de R$ 1,7 milhão, com recursos próprios do município.
O valor, somado aos investimentos de saneamento e energia elétrica, somam um montante de quase R$ 6 milhões. Os beneficiados pagarão pelo imóvel em prazo de 300 meses, com parcelas a partir de 10% de um salário-mínimo, cerca de R$ 132.
Autor(es): LUIS EDUARDO DE SOUSA / FOLHAPRESS