SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, telefonou para o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), para alertá-lo das “consequências desastrosas” que a revisão do Plano Diretor Estratégico (PDE) de São Paulo pode ter para a capital paulista.
Ele procurou também o secretário de Governo de SP, Gilberto Kassab (PSD), e se reuniu com a bancada de vereadores do PT de SP.
Tarcísio e Kassab teriam dito que vão se inteirar do assunto.
O substitutivo do projeto, que foi apresentado no último dia 23, está sendo aprovado a toque de caixa pela Câmara Municipal de São Paulo.
Embora altere radicalmente as regras para a construção de edifícios e a ocupação da cidade, afetando diretamente a vida de seus moradores, ele já foi aprovado em primeiro turno na Câmara –e será discutido em apenas mais oito audiências públicas.
A proposta é criticada de forma contundente por urbanistas e arquitetos, pois permitiria uma verticalização descontrolada da cidade, com a construção de arranha-céus nos miolos de bairros.
O Ministério Público de SP entrou com ação na Justiça para que a revisão seja melhor debatida.
Haddad, que se reuniu também com a bancada de vereadores do PT, diz que o projeto modifica o conceito de mobilidade da cidade –e altera o Plano Diretor aprovado em sua gestão, que recebeu prêmios internacionais como o ArchDaily e o ONU-Habitat.
A bancada do PT na Câmara se dividiu na votação. Quatro parlamentares do partido foram favoráveis ao projeto, causando constrangimento à legenda.
Vereadores contrários ao texto dizem que o substitutivo apresentado pelo vereador Rodrigo Goulart (PSD), relator da proposta, beneficia as construtoras em detrimento de regras que impediriam a deterioração completa da capital paulista.
O texto aprovado pela maioria dos vereadores prevê que as construtoras podem erguer prédios com até nove vezes o tamanho do terreno, se destinados a Habitação de Interesse Social (HIS).
O limite hoje é de quatro vezes o tamanho da área.
Os vereadores retiraram também trechos que beneficiavam a população de baixa renda em determinadas áreas localizadas nos eixos de transportes, ou perto de metrô, trem e corredores de ônibus.
Em artigo publicado na Folha, o professor da FAU-USP Nabil Bonduki, que foi relator do Plano Diretor em 2014 quando era vereador pelo PT, afirma que o substitutivo é um “retrocesso”, não possui “estratégia urbanística” e “promove o setor imobiliário”.
“Praticamente anula a estratégia de estruturação urbana do PDE, propondo uma verticalização dispersa e sem limites, elitizando ainda mais os eixos de transporte coletivo e comprometendo definitivamente os miolos dos bairros”, diz Bonduki.
A Câmara afirma que foram realizadas cerca de 50 audiências públicas e coletadas centenas de sugestões, embora o novo substitutivo tenha sido apresentado com mudanças substanciais.
O relator do substitutivo, o vereador Rodrigo Gourlart, afirma, em nota, que o texto foi amplamente discutido.
O projeto de revisão agora deve passar por um total de oito audiências públicas em menos de três semanas.
A previsão é que a votação definitiva, em segundo turno, ocorra na tarde do dia 21 de junho –a última audiência pública deve ocorrer na manhã do mesmo dia e pode trazer alterações no projeto.
Veja, abaixo, a íntegra da nota do relator do Plano Diretor:
“Os artigos 84 a 88 do regimento interno da Câmara e o artigo 41 da lei orgânica do município preveem como obrigatórias a realização de apenas duas audiências públicas. Não definem o momento da realização dessas audiências.
A Câmara foi muito além do que prevê a própria Lei, realizando quase 50 audiências públicas até o momento.
Questiona-se o fato de ter sido apresentado um texto substitutivo com diversas alterações após as audiências. Ora, não é justamente o que se espera do Legislativo quando este se propõe a ouvir a sociedade?
A Câmara recebeu o texto do Executivo, ouviu a sociedade e apresentou uma nova proposta após as audiências. Neste processo, a apresentação de um novo texto é o que se espera de um Legislativo atuante e que não é mero chancelador do Executivo.
Se fosse o contrário, se a Câmara tivesse recebido um texto pronto e votado do jeito que veio, os vereadores estariam abrindo mão do seu papel de legislar e aí, sim, poderiam ser questionados por aprovar um texto sem ouvir ninguém.
Também foi garantida total publicidade ao texto do relator. Assim que ele ficou pronto foi publicado no Diário Oficial, no Portal da Câmara, no site especial do Plano Diretor. O texto foi apresentado numa audiência pública, foi detalhado pelo relator em Sessão Plenária e ainda haverá outras audiências até o final do processo de votação.
A Câmara ouviu a sociedade como um todo. Ouviu entidades, associações de bairro e, obviamente, ouviu o setor imobiliário, que é parte deste processo.
Prova disso é que o projeto de lei foi aprovado na quarta (31 de maio) com 42 votos dos 55 vereadores.”
com BIANKA VIEIRA, KARINA MATIAS e MANOELLA SMITH
Autor(es): MÔNICA BERGAMO / FOLHAPRESS